Em sessão de julgamento realizada no mês de abril deste ano, o Plenário do Supremo Tribunal Federal – STF, por maioria de votos dos ministros, modulou os efeitos da decisão que declarou a inconstitucionalidade de dispositivos da Lei Complementar nº 87/1996 (artigos 11, § 3º, II - inconstitucionalidade parcial, sem redução de texto-; 12, I, no trecho “ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular” e 13, § 4º, todos da Lei Kandir), os quais possibilitavam a cobrança do ICMS pelos Estados na transferência de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo contribuinte.
Em síntese, a Ação Declaratória de Constitucionalidade – ADC 49, proposta pelo Governo do Estado do Rio Grande do Norte, pretendia o reconhecimento da constitucionalidade de dispositivos da Lei Kandir (LC nº 87/96) que permitiam a incidência tributária do ICMS sobre a transferência interestadual de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular, foi julgada improcedente pelo Plenário do STF em 2021. Posteriormente, foram opostos Embargos de Declaração os quais foram julgados procedentes tão somente para modular os efeitos dessa decisão de forma que sua eficácia seja prospectiva.
Para o Relator, Ministro Edson Fachin, o pedido para a modulação dos efeitos temporais da decisão proferida na ADC 49 deve ser acolhido em razão da necessidade de se buscar “segurança jurídica na tributação e equilíbrio do federalismo fiscal”. Desta forma, julgou parcialmente procedente os embargos para que a referida decisão tenha eficácia a partir do exercício financeiro de 2024, ressalvados os processos administrativos e judiciais pendentes de conclusão até a data de publicação da ata de julgamento da decisão de mérito.
Pontuou, também, sobre a necessidade de regulamentação da transferência de crédito de ICMS, nessas operações, entre estabelecimentos do mesmo titular pelos Estados (por meio de convênio celebrado pelo CONFAZ). Tal entendimento prevaleceu e foi seguido pelos votos dos ministros Ricardo Lewandowski (aposentado), Luís Roberto Barroso, Gilmar Mendes, Cármen Lúcia e Rosa Weber (Presidente).
Os demais ministros (Dias Toffoli, Alexandre de Moraes, Nunes Marques, Luiz Fux e André Mendonça) – os quais foram votos vencidos – divergiram no sentido de a eficácia da decisão de mérito iniciar após 18 (dezoito) meses, contados da data de publicação da ata de julgamento dos embargos de declaração, bem como a regulamentação da transferência de créditos de ICMS, neste caso, ocorresse por meio de lei complementar e não por convênio celebrado entre os Estados.
Dada a relevância e repercussão social envolvendo a matéria, é importante ressaltar que a decisão é benéfica aos contribuintes do ICMS, principalmente para as empresas do setor atacadista e varejista.
Na prática, portanto, considerando a modulação de efeitos definida pelo STF, a cobrança do ICMS nas operações interestaduais entre estabelecimentos de um mesmo contribuinte ainda poderá ser efetuada pelos Estados até o final de 2023, mantida neste período a atual sistemática de creditamento do ICMS.
Significa dizer que, a partir de 1º de janeiro de 2024, os Estados não poderão mais efetuar a cobrança do ICMS quando ocorrer o deslocamento de mercadorias entre estabelecimentos pertencentes ao mesmo titular, ainda que localizados em Estados federados distintos.
Em outras palavras, ficou estabelecido no referido julgamento de mérito que os efeitos dessa decisão (não incidência tributária do ICMS nas operações interestaduais envolvendo estabelecimentos do mesmo titular) terão eficácia a partir do exercício financeiro de 2024.
Cumpre salientar ainda, que os Estados têm até o final desse ano para disciplinar, por meio de convênio celebrado no âmbito do Conselho Nacional de Política Fazendária (CONFAZ), a transferência de créditos de ICMS entre estabelecimentos do mesmo titular. Caso transcorra este prazo sem que os Estados regulamentem a matéria, fica reconhecido o direito de os contribuintes transferirem tais créditos.
No que diz respeito aos processos administrativos e, também, aos judiciais pendentes de conclusão até a data de publicação da ata de julgamento da decisão de mérito (29.04.2021), existe ressalva quanto à modulação supracitada dos efeitos. Assim, nestes casos, os contribuintes com decisão (administrativa ou judicial) favorável não terão mais de efetuar o recolhimento do ICMS nessas operações, bem como poderão requerer a restituição dos valores já pagos, cuja análise deverá ser realizada caso a caso, observado o prazo prescricional de 5 (cinco) anos.
Oportuno informar sobre as ações promovidas no decorrer do julgamento da ação pela FecomercioSP, por meio do Conselho de Assuntos Tributários (CAT), Conselho do Comércio Atacadista (CCA), e pelo Conselho Superior de Direito (CSD), além das discussões promovidas pelo Conselho de Defesa do Contribuinte do Estado de São Paulo (CODECON), cuja Entidade ocupa a presidência, as quais exemplificamos abaixo:
Maio/2021
Durante reunião do Codecon-SP, Carlos Henrique de Azevedo Oliveira, presidente da Comissão Técnica Permanente do ICMS (Cotep/CONFAZ), debateu sobre o julgamento da ADC 49. Na oportunidade, os membros disseram que deveriam aguardar o encerramento do julgamento para buscar uma solução “não havia um consenso entre os estados”.
Agosto/2021
O Codecon-SP recebeu Luiz Marcio de Souza, coordenador da Administração Tributária (CAT), que tomou ciência sobre a necessidade de que após o encerramento da ação (ADC 49) o Estado de São Paulo apoie a criação de um Convênio ICMS Confaz concordando com o aproveitamento dos créditos das operações.
Dezembro/2021
O CAT e o CSD da FecomercioSP encaminharam Memorial de Julgamento na ADC 49 aos ministros do STF, requerendo a modulação do julgamento, para que sejam preservadas as operações, bem como haja a necessidade de se buscar a segurança jurídica na tributação.
Janeiro/2022
O CAT solicitou presença na reunião do Grupo de Trabalho 67, que tratou das transferências interestaduais, a fim de expor os efeitos preocupantes da decisão caso não ocorresse a preservação das operações. A reunião aconteceu no dia 7 de fevereiro do mesmo ano.
Julho/2022
O Conselho de Assuntos Tributários (CAT) e o Conselho do Comércio Atacadista (CCA) da Federação manifestaram de forma favorável à aprovação do Projeto de Lei 332/2018 do Senado, que traz alternativas para o contribuinte que não deseja pagar o imposto nas referidas operações ou até para aquele que preferir adotar a sistemática de aproveitamento do crédito do ICMS nos casos de transferência de mercadoria entre estabelecimentos do mesmo contribuinte.
Portanto, apesar do desfecho favorável aos contribuintes do julgamento junto ao Supremo Tribunal Federal, é necessário a participação dos debates para garantir o aproveitamento dos créditos de ICMS, por meio de regulamentação via Convênio CONFAZ e/ou aprovação de Lei Complementar no âmbito do Congresso Nacional.
Maiores informações acerca da decisão proferida, com data de publicação da ata de julgamento em 02.05.2023, poderão ser obtidas no arquivo anexo.
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